Sr.Rui-homenagem
“Quem
conta aumenta um ponto”, mas esta é uma história verdadeira e que pode começar
como todas as histórias infantis: “ERA UMA VEZ...”.
-SENHORAS E SENHORES! Agora, com vocês, os
melhores palhaços da atualidade: GELEIA E MALUQUINHO.
E lá
vinham eles, dando piruetas, provocando riso, agradando crianças e adultos. As
peripécias infantis não escondiam a vontade de ser um artista de circo, de
correr o mundo nas lonas de um picadeiro.
-“O
palhaço o que é?”
-“É
ladrão de mulher.”
Aquele mundo atraia Geleia e o transportava a lugares
onde a alegria era a única companheira. E ele, adolescente, pulava, girava,
sorria. O mundo lhe pertencia e era o lugar onde desde pequeno quisera estar. Desde
criança adorava tudo que o tirasse da mesmice do dia a dia: o parquinho que
chegava ao povoado com seu carrossel que girava, girava provocando gritos e
sensação de liberdade. A roda gigante também era parceira e, com ela, ele ia
conquistando as meninas de sua idade.
Geleia
e Maluquinho era o sonho realizado.
Trabalhar no circo! Essa vontade de alguma forma ter o controle de seu
destino é que o fazia sonhar desde os tempos de moleque. Fora uma criança
arteira, desassossegada. Fugiu várias vezes quando criança; pegava o trem e ia
a São Paulo, deixando os pais desnorteados. No final do dia estava de volta
pronto para o castigo. O desejo acalentado há tanto tempo, finalmente, ao
alcance das mãos.
Naquela
manhã, o impossível aconteceu: O circo estava na cidade e recrutava artistas
para diversos papeis. Era um desafio a vencer.
O pai
faleceu cedo, mas a mãe o trazia a “rédeas curtas”. Viúva, a ela cabia a
educação dos filhos e Nego, como era chamado em família, passava por vários
apuros, porque era o que dava mais trabalho: a algazarra com os amigos, as
notas regulares, o namorico adolescente. Tudo isso o levou para o trabalho bem
cedo, como funcionário do Diário da cidade.
-Quem sabe adquire assim mais responsabilidade
e jeito- diziam os pais.
Aos 16
anos já havia conquistado aquela que seria sua companheira por toda uma vida: a
Darci. Darci era uma adolescente de 12 anos. Do namoro ao casamento foram
quatro longos anos. De família humilde, Darci conhecia bem a luta do dia a dia.
Desde cedo trabalhou fora para ajudar a família. Juntos iriam unir esforços. Casaram-se,
Nego tinha apenas 20 anos.
Só aí
que o Geléia da infância percebeu que o papel de palhaço não lhe cabia mais: na
nova vida era preciso “matar um leão a cada dia”, o seu novo papel estava mais
para “domador de feras”. Equilibrista na vida, Nego sabia que o picadeiro seria
só em sonhos, pois a nova vida era preciso responsabilidade. A esposa teve que deixar de trabalhar para
cuidar dos filhos e eles foram chegando um atrás do outro: Rui Carlos, Roberto
e Sérgio. O dinheiro foi diminuindo, as despesas aumentando. Nesta época, já
trabalhava no DAEE, como funcionário público e, por isso, o casal teve que
mudar para Casa Grande, um distrito de Mogi das Cruzes.
A vida
não foi fácil, Nego sentia o que era ser pai de família. As brincadeiras, o bar
com os amigos, tinha que ser repensado. Duas mulheres foram fundamentais para
que ele se tornasse o homem de hoje: Dona Lúcia, sua mãe, e Dona Darci. As duas
se uniam se as coisas não andassem no devido lugar. E Nego não tinha alternativa,
a não ser mudar de rumo. Errou, acertou, mas continuou a sorrir...
Nego mesmo com pouca idade, era um pai
exemplar. Quantas vezes, quando os filhos adoeciam, sozinho os levava para São
Paulo em busca de socorro. Hoje, eles reconhecem o sacrifício que o pai nunca
deixou de fazer e isso serve de exemplo em suas vidas. Quando os dois mais
velhos precisaram estudar o ginásio (como era chamado a quinta série do ensino
fundamental), tiveram que deixar Casa Grande e morar na casa de parentes: O Rui
Carlos com a tia Tereza, o Roberto com a avó materna. Os pais “morriam” de
saudades; na época era muito difícil o transporte de ônibus. A saudade
aumentava a cada dia e conscientes que o melhor era a família novamente junta,
quando o Sérgio terminou a 4ª série, todos vieram morar em Mogi das Cruzes.
Nego veio transferido para o DAEE de Mogi das Cruzes.
A vida
começava a melhorar. A esposa companheira das lutas e dos sacrifícios começou a
trabalhar como cabeleireira e os meninos, já adolescentes, ajudavam
financeiramente nas despesas de casa. E assim, Nego foi percebendo o quanto era
importante para a família que construiu. Como eram especiais seus exemplos de
vida na formação de seus filhos. Foram barreiras vencidas, obstáculos
superados.
Já
aposentado continuou a ajudar a esposa nos afazeres domésticos: na cozinha, com
suas farofas, seus pudins; nas compras de supermercados... Hoje, é um homem
feliz e realizado. Feliz porque plantou alegria. E essa alegria, distribui a
sua bisneta, Valentina, aos netos e filhos e a toda a vizinhança. Sempre está
com uma criança no colo, fazendo-a sorrir tal qual o palhaço Geléia que
representava na adolescência:
É com orgulho que seus filhos o
estão homenageando neste seu aniversário. Valeu Sr.Rui!
-Senhoras e Senhores, bem vindo ao
Circo da Vida: o Palhaço Geléia está completando 80 anos. Sejam
felizes, a alegria não cobra ingresso.
Para terminar, um pensamento de Mário
Lago que parece traduzir a vida do Sr. Rui nestes 80 anos:
“Fiz o que quis e fiz
com paixão.
Se a paixão estava
errada, paciência.
Não tenho frustrações...
Não fiquei vendo a
vida passar,
Sempre acompanhei o
desfile”.
O circo da vida se encerrou em
28/09/2016. Aos 82 anos, em setembro, a voz e as brincadeiras de geleia já eram
saudades, mas no coração dos que o amavam ficou e sempre ecoará no picadeiro
dos sonhos.
Adeus Geléia, adeus Ruy Gilberto Vieira, seja
feliz no circo dos céus onde a alegria reina para sempre. E, como última
homenagem, a música que gostava tanto de cantar:
“Tá tá tá tá na hora,
Po pó pode tudo
agora,
Sou mo mole pra falá
Mas sou um pintacuda
pra beijá”
Tá na hora de ir
embora, mas no coração de todos que o amavam continuará sempre presente. Tchau.
Seja feliz eternamente.
Hoje, um ano de sua
partida. Só restam as lembranças alegres.
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